quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Belém

Estou sentado na Estação das Docas, em Belém do Pará. A tarde começa a morrer. Ouço murmúrios - risos distantes, preces, Mozart. Uma mulher passa trotando ao meu lado e deixa um rastro de Chanel número 5 e maresia. Os cheiros disparam o mecanismo da memória e abrem a porta do coração, onde há jardins, grandes hotéis, romance, poesia, eternidade, as mulheres que amamos. Outra mulher vem em minha direção. Lembra um arbusto, porque é jovem e seus olhos têm clorofila, pois são duas esmeraldas. Traja-se com um vestido de seda estampada, continuidade de sua pele de ébano. Terá vindo da Guiana Francesa?, ou das Antilhas Holandesas? Veio da República Dominicana? Ouço merengue.

República Dominicana! Lembrei-me do Walmir Botelho, que me recomendou A Festa do Bode, de Mario Vargas Llosa, romance ambientado na ditadura do general Rafael Leónidas Trujillo.

A tarde morre docemente. Pedi à Virgem de Nazaré que proteja as crianças e as flores, para o mundo continuar ouvindo risos e a sentir perfume; pedi, ainda que dê a cada um dos que eu amo diamantes e rubis; e, para mim, uma rosa.

A tarde morre inexoravelmente; escorre, como um rio de luzes que se afogam no mar da noite, para ressurgir no ventre da cidade, que se abre como uma boca à minha frente. Continuo sentado à mesa, na companhia da minha memória e de meus fantasmas. Belém, à noite, é como o mistério feminino.

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