Rolos de fumo elevavam-se do braseiro, onde, enfileirados, havia espetos de alcatra, de porco, de frango, de linguiça, de coração de galinha, de provolone, e mistos. Em meio aos pedaços vermelhos de carne, havia nacos de gordura, amarelos, contrastando com o tom escuro da carne, à medida que ia assando. Havia também churrasquinho de maminha. Mas qualquer um custava apenas um real, e era servido com farofa de farinha paraense, mandioca e vinagrete, de modo a se constituir em um perfeito jantar. A churrasqueira era enorme. A fumaça elevava-se e perdia-se além da claridade das lâmpadas dos postes. O dono do negócio andava feito uma formiga, para lá e para cá, de camiseta, bermuda e sandálias japonesas, servindo cerveja e churrasquinho. A cerveja de maior saída era Skol, seguida de Antarctica e Bavária. Mas havia também Boemia e Budweiser. E Bhrama, que quase não saía.
- Brasília está cheia de gente que fracassou nas suas cidades natais. Pergunte, por exemplo, a um carioca o que ele faz aqui. Virá com aquela conversa de que o Rio está violento. Mas o Rio está cheio de gente de sucesso - disse Lucas, que nascera em Juiz de Fora, mas fora educado no Rio de Janeiro.
- Para mim, basta uma assessoria num posto qualquer, mesmo que seja em Santo Antônio do Descoberto. Mas tenho fé em Deus que o deputado vai me arranjar a assessoria de imprensa do Hospital Regional de Taguatinga - disse Eduardo, de Belém do Pará, mastigando um naco de provolone.
- Santo Antônio do Descoberto fica em Goiás e o deputado não arranja nada para ninguém. Só pensa nele mesmo. Quando chegou em Brasília não sabia nem andar. Agora já sabe até vestir terno. Ele não arranjou emprego nem para o Gordo. Na última edição do jornal do Gordo havia pelo menos seis fotos do deputado. Ele só diz venha a nós... - disse Lucas.
- Mas também o Gordo é um picareta - disse Mino, de São Paulo.
- Mais do que o deputado? - Lucas perguntou.
- Todos nós trabalhamos na campanha do deputado: o Eduardo, no jornal do Gordo; o Lucas, na Gazeta de Taguatinga; e eu, no Gogó da Ema. Agora, é hora, bicho, de a gente ganhar uma assessoria - disse Mino.
Era mais de uma da manhã quando Eduardo voltou, devagar, para casa, perto da Rua das Palmeiras, no centro de Taguatinga. O encontro com o deputado fora marcado para a meia-noite do dia seguinte. “Por que será que o deputado só se reúne assim tão tarde da noite?” - Eduardo perguntou a seus botões. “A reunião será no sindicato dos donos de postos de gasolina.”
Taguatinga, 11 de abril de 1999
Este conto integra o livro O casulo exposto, à venda nos sites das livrarias Saraiva, Cultura e Leitura. Em Brasília, está à venda nas livrarias Leitura do Conjunto Nacional e do Pátio Brasil.
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