segunda-feira, 7 de abril de 2014

Uma ou duas orientações a uma jovem repórter

Cara Polyana. O mais importante de tudo é o velho prazer que sentes ao realizar teu trabalho, prazer que cresce quando tens a sensação de que és lida e de que tuas matérias lançam luz, de alguma forma, aos teus leitores. A isso podemos chamar de talento.

Fundamental, Polyana, para o que fazemos, é a retidão. Jamais, coisa alguma deverá corromper a missão do jornalista. Nunca recebas presente, muito menos dinheiro, para mentir; a verdade é teu único objetivo. Anotas tudo, observas teus interlocutores nos olhos, ouves todas as partes, checas tudo, para se aproximar o mais perto possível da verdade, essa velha dama pantanosa.

Mergulhas na tua língua natal como nos braços do teu amado, apreendes seus murmúrios e fruis suas palavras e as nuances das palavras, como a música do voo. É preciso que escrevas como amas, porque o amor é sempre perfeito.

Lê gigantes como Machado de Assis, Graciliano Ramos, Euclides da Cunha, Jorge Amado, pois eles, e todos os outros, resumem o Trópico. Lê também, e se possível nas suas línguas nativas, Ernest Hemingway, Norman Mailer, Joseph Conrad, Kurzio Malaparte, Tomasi Di Lampedusa e Gabriel García Márquez, para começar.

É porque, Polyana, os grandes livros contém toda a dimensão humana, e nos livram, a todos nós, de preconceito e de intolerância.

És muito jovem e tens tanto para viver. Por isso, aprendas idiomas, curtas o trabalho dos grandes artistas, viajas, batas longos papos com os que tu amas e, principalmente, ouça-os. Isso, além de nos enriquecer, tira, às vezes, da fossa, até suicidas.

A missão do jornalista é muito importante, Polyana, pois na busca da verdade e da justiça lança luz sobre o pântano das trevas, e onde há luz é impossível haver treva.

Os salários baixos, as incontáveis horas de trabalho, as dificuldades inerentes à profissão, a insalubridade da investigação policial, o confronto com políticos corruptos, o convívio com pessoas arrogantes e de quem dependemos ou a quem temos que nos submeter, nada disso é maior do que a consciência do dever do repórter.

E depois, que dinheiro pode ser mais valioso do que o dever cumprido? Haverá alguma coisa superior à paz de espírito?

Eu te desejo todo o sucesso, Polyana, e que a tua luz ilumine o riso das crianças.

Um comentário:

  1. Grande lição, Ray. Jornalismo acaba sendo, mesmo, um sacerdócio. Mas é uma delícia praticá-lo. Eu não saberia viver sem ele. Parabéns. Tomara que a Polyana compreenda tua mensagem.

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