terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Em Origem, Dan Brown mostra que o celular é a prova de que o ser humano é um ciborgue



BRASÍLIA, 21 DE JANEIRO DE 2020 – Outro dia, conversando com um amigo meu, crítico literário, falávamos sobre livros clássicos, revolucionários, que mudam o modo de escrever dali para frente. Durante a conversa, saiu como um expletivo, perguntei-lhe:

– E Dan Brown?

Ele deu um pulo e fez cara de nojo.

Quando perguntei isso a ele, foi pensando em um fator que fez de mim um leitor inveterado de livros policiais e de detetive, e cinéfilo de filmes do gênero. Dan Brown é um mestre em criar tramas intensas. Mas no seu último livro, Origem, ele perdeu o prumo. A sinopse de Origem é sobre um gênio da informática, bilionário, ateu, que prepara um show para dar uma informação mundial que levaria ao fim das religiões: a resposta às perguntas: de onde viemos e para onde vamos?

A meu ver, o livro tem um problema: é cansativo, pois faz longas digressões pela arte espanhola e desvia-se por um caminho secundário abordando o fanatismo dos espanhóis pela Igreja e o saudosismo pelo ditador nazista Francisco Franco por parte das gerações mais velhas, além de que a grande informação do cientista, que revolucionaria a Humanidade, é chinfrim.

Fora isso, Origem prende o leitor do início ao fim, ao longo de mais de 400 páginas, e contém algo que acaba lembrando obras canônicas. Da mesma forma que os suecos Stieg Larsson e David Lagercrantz, da Série Millennium, é um mergulho no uso da internet, Origem pula de cabeça na inteligência artificial.

A Humanidade, desde os primórdios da História, sempre travou um embate entre religião e ciência. Houve uma época em que a Igreja Católica Apostólica Romana dominou a Europa e as Américas através do terror, e tentou agarrar também o Oriente, até que a ciência mostrou que a coisa não passava de luta pelo poder, por domínio e dinheiro.

Ao longo da História, sempre houve avatares, espíritos ascensionados, como Buda e Jesus Cristo, ou os grandes cientistas da Grécia clássica, entrando pelo Renascimento e pela informática. Mas foi no século XIX que houve a explosão do espiritismo, a consciência de que somos seres espirituais; hoje, os títulos com esse tema tomam conta de um bom pedaço das estantes das livrarias.

Neles, há informações, inclusive endossadas pela ciência, de que viemos de uma consciência sem início e sem fim, onipresente, que costumamos chamar de Deus, e que retornaremos a Ele.

Cientistas já tentaram criar a sopa primordial para ver se dali surgiria vida, mas não surgiu nada, pondo por água abaixo o evolucionismo. Nossos corpos são fruto de inteligência artificial de engenheiros siderais; usamos esses corpos como escafandros aqui na Terra. No fim das contas, todos são espíritos. A diferença, aqui neste mundo material, é que uns acreditam que são matéria mesmo, enquanto outros desenvolvem sua mediunidade e assim utilizam com sabedoria livre arbítrio.

Desde sempre os escritores fazem estas perguntas: De onde viemos? Para onde vamos? Entre uma e outra, permeia a existência humana. Aos poucos, principalmente a literatura e o cinema, vão entendendo, às vezes na diagonal, como em Origem, que nossos corpos nada mais são do que ciborgues, configurados pela família, pela religião, pela academia e pelo patrão. Há até profissionais nessa área: são os coachings, que preparam o trabalhador para virar escravo.

Se Origem não é literatura canônica, e nem é um dos melhores momentos de Dan Brown, é um tour por um dos países mais encantadores da Europa: a Espanha. E uma crônica do pós-modernismo. Nele, temos a sensação de que o homem não vive mais sem a máquina; ninguém larga o telefone celular.

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