RAY CUNHA
BRASÍLIA, 31 DE JANEIRO DE 2021 – Meus amigos partiram. Adoradores
de Lula Rousseff, Fernando Henrique Cardoso, Che Guevara, família Castro, Hugo
Chávez Maduro, Foro de São Paulo, Karl Marx. Adeus fabianos, bolivarianos.
Houve, inclusive, um, que, depois de ler artigo meu referindo-me à prisão de
Lula, pôs fim a uma estupenda amizade. Alguns, foram para o mundo espiritual;
outros, os da juventude, permanecem fiéis a Karl Marx. E há os que simplesmente
perdi nas dobras do tempo.
Mas restou uma grande quantidade
de amigos, que encontro na minha estante. Estou certo de que ainda vou topar
com alguns deles. Quem sabe Ernest Hemingway, Antoine de Saint-Exupéry, Gabriel
García Márquez e Masaharu Taniguchi. E há os amigos novos, como Laércio Fonseca
e Jorge Bessa, que estão me levando para conhecer a Via Láctea.
Além da família, da estante e dos
amigos que vivem no meu coração, tenho as madrugadas, jasmineiros e rosas, que
são eternas, o mar, o azul e o Sudoeste. Às vezes, Mozart toca ao piano o som
da Terra girando no espaço. E quando escrevo um poema, o terremoto do primeiro
beijo se instala em mim durante vários dias.
O amigo com quem eu conversava
durante horas sobre livros e escritores partiu para a Venezuela, onde espera
fruir da companhia de Nicolás Maduro. Mas não fiquei sozinho, porque converso
com vivos e mortos no meu escritório, nas livrarias, nos cafés.
O século 20 ficou realmente para
trás. Com a invenção da web os políticos não conseguem mais se concentrar nas
tetas da burra e matar bebês nas maternidades nem crianças nas escolas, em
escala industrial, pois a banda boa dos jornalistas é a própria população. É
por isso que na China e na Coreia do Norte a web é proibida.
Desde 1 de janeiro de 2019,
assassinos, ladrões, assaltantes, estupradores, traficantes, escravocratas,
corruptos em geral, estão cada vez mais furiosos, esperneando nos seus
palácios, dentro dos seus automóveis de vidraças negras, nas suas amplas casas
e apartamentos.
Ficaram para trás honoráveis bandidos,
carcomidos pelas larvas da corrupção, os beiços macilentos grudados nas tetas das
verbas federais, das mordomias, das diárias, dos cabides de emprego. Os novos
tempos vieram para ficar. Em 2018, enjaularam a hiena velha. Em 2019, ano do
resgate das nossas esperanças, a boca do abismo se escancarou para engolir as
cinzas dos fabianos, lobos em pele de ovelha.
A ciência começa a descobrir que somos seres espirituais, que o corpo é somente uma experiência material necessária para evoluirmos e ascendermos, e que a matéria não existe de fato, pois tudo muda, de um momento para outro. Nascemos, tornamo-nos criaturas magníficas, perdemos energia, ficamos igual maracujá de gaveta e desaparecemos fisicamente.
O passado não existe, nem o futuro. Somos eternos agora, fortes como as rosas de nióbio, intensos como o perfume dos jasmineiros de Macapá, em julho, serenos como o porto seguro que é a mulher amada, como o som do apartamento de madrugada, uma xícara de café Três Corações, gourmet, às 5 horas da manhã, buraco negro explodindo azul quântico.
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