Joaquin Fhoenix e Vanessa Kirby: Napoleão e Joséphine |
RAY CUNHA
BRASÍLIA, 30 DE NOVEMBRO DE 2023 – Muita gente, até com curso universitário, pensa que cinebiografia é documentário. Dois exemplos: Jesus Cristo de Hollywood tem olhos azuis, é louro e alto. O Jesus histórico fatalmente teria olhos e cabelos escuros e seria baixinho. É como os judeus eram no início da era cristã, segundo registros da época e arqueólogos.
Outro exemplo é Hitler. Vários atores fizeram o papel dele e um que se destacou foi o ator suíço Bruno Ganz. Não se destacou porque parecesse com Hitler, mas porque recriou o personagem de forma marcante.
Também as pessoas confundem livro com filme. Quantas vezes ouvi alguém reclamar que tal filme não se parecia com o livro. É claro que não. Cinema é uma coisa e livro, outra coisa. Livro se faz com palavras e cinema, com imagens, movimento e som. Às vezes, o cineasta aproveita apenas o argumento, como Francis Ford Coppola fez em Apocalypse Now, pegou a trama psicológica de O Coração das Trevas, de Joseph Conrad.
E há quem confunda obra de arte, no caso, aqui, cinema, com História. Como em Napoleão, de Ridley Scott, ora nos cinemas. Os franceses estão uma fera com Scott. Mas o que Scott fez foi um filme. Dramatizou Napoleão, só que encarnado por um Joaquin Phoenix sonolento. Pegou o drama íntimo de Napoleão, os cornos com que sua esposa, Joséphine de Beauharnais, encarnada por uma exuberante Vanessa Kirby, adornou a cabeça do corso, e fez seu filme.
Vi-o, hoje. É um filmaço. Dirigido por um dos maiores cineastas de todos os tempos. Deverá levar Oscar de figurino e fotografia. Mostra também que, por mais que o país esteja convulsionado, o Estado permanece.
Nós, artistas, sempre extraímos alguma coisa das obras de arte que lemos ou vemos. Hemingway aprendeu muito com Cézanne. Gosto dos obesos do Bottero e presto bastante atenção em algumas personagens e sequências cinematográficas; em Fellini, principalmente. Creio que até hoje copia-se Dom Quixote de la Mancha.
Quanto aos comunistas, eles já estavam lá, na Revolução Francesa. Conseguem manter-se no poder até por muito tempo, como no caso da URSS, mas um dia acabam indo para o lugar que está reservado a eles na História: o esgoto.
Senti que os críticos de cinema reclamam que Scott não deu a atenção que eles acham que as batalhas campais mereciam, mas a grande batalha do Napoleão de Scott é consigo mesmo. O filme é um épico, mas um épico intimista.
Ridley Scott é inglês e está fazendo, hoje, 86 anos. Já deixou seu nome na história do cinema com Alien (1979) e Blade Runner (1982). Fez também o épico Gladiador (2000). Foi influenciado por H. G. Wells e por 2001: Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick. “Assim que eu vi aquilo soube que poderia fazer igual.”
Bom, agora vamos ao Napoleão Bonaparte histórico. Nasceu em Ajaccio, Córsega, em 15 de agosto de 1769, e morreu em Longwood, Santa Helena, em 5 de maio de 1821. Quando a Revolução Francesa eclodiu, em 1789, ele estava servindo como oficial de artilharia no exército francês. Sua atuação firme para controlar a anarquia que se seguiu o tornou general aos 24 anos.
Aos 26 anos, conquistou toda a Península Italiana, tornando-se um herói de guerra na França. Em 1798, lidera uma expedição militar ao Egito. De volta à França, em novembro de 1799, orquestra um golpe e se torna o primeiro cônsul da República.
Na década de 1810, comanda as Guerras Napoleônicas e domina quase toda a Europa, até a Campanha da Rússia, em 1812, quando o inverno russo quase acaba com o exército de Napoleão. Em 1813, uma coligação europeia o derrota e no ano seguinte invade a França, forçando Napoleão a abdicar e seguir para o exílio na ilha de Elba.
Em fevereiro de 1815, Napoleão escapa de Elba e consegue assumir novamente o controle da França. Nova coalizão é formada e o derrota na Batalha de Waterloo, em junho. É exilado em Santa Helena, no Atlântico Sul, onde morreu em 1821, aos 51 anos.
Napoleão implementou reformas liberais não só na França, mas em todos os países que controlou. O Código Napoleônico influenciou o Direito em mais de 70 nações em todo o planeta.
Afirma o historiador britânico Andrew Roberts: “As ideias que sustentam nosso mundo moderno – meritocracia, igualdade perante a lei, direitos de propriedade, tolerância religiosa, educação secular moderna, finanças sólidas etc. – foram defendidas, consolidadas, codificadas e estendidas geograficamente por Napoleão. Além disso, ele também acrescentou uma administração local racional e eficiente, o fim do banditismo rural, o incentivo à ciência e às artes, a abolição do feudalismo e a maior codificação de leis desde a queda do Império Romano”.
Em segundo plano, no filme, desenrola-se a Revolução Francesa (1789-1799), capaz, por si só, de render uma telenovela de um ano, movimentadíssima. O rei, Luís XVI, absolutista, escorchava o povo com impostos e gastava a rodo. O Iluminismo começava a iluminar as mentes. Em 1793, Luís XVI perdeu a cabeça, literalmente.
O filme começa com a execução na guilhotina de Maria Antonieta, arquiduquesa da Áustria, esposa do rei Luís XVI e Rainha Consorte da França e Navarra (1774-1792). Casou-se em abril de 1770, aos 14 anos, com o então delfim de França, que subiria ao trono em maio de 1774, como Luís XVI. O povo a detestava, acusando-a de perdulária, promíscua e frívola. Nove meses após a execução de Luís XVI, Maria Antonieta foi julgada e condenada por traição, e perdeu a cabeça em 16 de outubro de 1793.
Que casal!
Essa história lembra o Brasil atual: ditadura, inflação e gastança
desenfreada. Se Ridley Scott fosse brasileiro deitaria e rolaria. Não! Seria
jogado na Papuda.
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