sábado, 28 de dezembro de 2024

Criar é preciso, fazer sucesso não é preciso

Ray Cunha na lente do artista plástico André Cerino (Brasília/DF - 2013)

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 28 DE DEZEMBRO DE 2024 – Deus existe? Por que existimos? O que é o Universo? Tudo isso seria imaginação? A mente humana não tem capacidade para responder a essas perguntas. A vida é um mistério. Mas há sentimentos que nos impelem a seguir, como alegria, amor e criação. 

Alegria é o próprio prazer de viver e de curtir tudo o que a vida nos oferece, mas só é possível haver alegria em uma atmosfera de amor. O que é amor senão o bem, a ordem, a luz? E como tudo o mais na vida, o amor deve ser aprendido e desenvolvido. 

O psicanalista, filósofo e sociólogo alemão Erich Fromm disse: “O amor é uma atividade e não um afeto passivo; é um erguimento e não uma queda. De modo mais geral, o caráter ativo do amor pode ser descrito afirmando-se que o amor, antes de tudo, consiste em dar, e não em receber”. 

Amor costuma ser confundido com paixão, apego, mas o amor não prende; liberta. Não mata; salva. Não se apossa; é absolutamente livre. 

Segundo o filósofo japonês Masaharu Taniguchi, fundador da Seicho-no-Ie: “Quando a sua vida cotidiana é regida pelo amor, o homem vivifica a si mesmo e também as pessoas arredor. Isso porque amor é vida”. 

O filósofo holandês Baruch Espinoza diz que o amor é o elemento que conduz ao mais elevado grau de conhecimento e determina o estado de felicidade ou de tristeza. E para o psiquiatra suíço Carl Gustav Jung “o amor é como Deus: ambos só se oferecem a seus serviçais mais corajosos”.

Acredito que realizar o bem e a ordem, e caminhar para a luz com a criatividade, geram alegria. Criar é imaginar, inventar, elaborar conceitos, produzir coisas inéditas, renovar-se constantemente, descobrir novas percepções da realidade, potencializar o que já se sabe, expandir a mente, estimular a curiosidade científica, desenvolver o pensamento crítico, aprender coisas novas, encarar os desafios como oportunidades, deixar a mente vagar nos livros, nos mapas, no Cosmos. 

O que me impulsiona é o ato de criar. Isso começou no quarto do meu irmão mais velho, Paulo Cunha. Poeta, leitor inveterado, o quarto dele, que chamávamos de Quartinho, na Casa Amarela, a casa da minha infância, era cheio de livros, revistas e gibis. Até hoje sonho com o Quartinho. 

Antes dos 5 anos, quando me foi permitido entrar no Quartinho e folhear as revistas e os gibis, todo um universo se descortinou na minha mente. Tornei-me, então, um ser todo poderoso naquele universo divino. Aí, deparei-me com as palavras. Eu precisava decifrar as letras e saber o que diziam, pois diziam sobre o universo que acabara de descobrir. 

Foi assim que aos 5 anos, movido pela urgência da leitura e auxiliado pela minha mãe, Marina Pereira Silva Cunha, conquistei, definitivamente, o mundo que acabara de descobrir. 

Aos 9 anos, produzi literatura epistolar, alinhavei uma carta à minha mãe, que viajara de Macapá/AP a Belém do Pará; nessa cartinha, falei do sofrimento que a separação me causou. Aos 13 anos, escrevi um poema para a musa da minha geração, a poeta Alcinéa Maria Cavalcante. Ela não tomou conhecimento do poema, mas o poema em si contemplava todas as minhas expectativas. Aos 17 anos, publiquei, juntamente com os poetas Joy Edson e José Montoril, XARDA MISTURADA. Nunca mais parei de escrever. 

Sucesso? Refiro-me a sucesso de vendas. Não é importante. Se acontecer é maravilhoso. Mas não é o mais importante. Acho, ou melhor, sinto, que o importante é criar. Já me deito com a perspectiva de me levantar de madrugada para criar, para me encontrar com personagens de ficção, mulheres estonteantes, homens de ação, santos e assassinos, iluminados e loucos. Nesse universo, frequento cidades que descobri no mapa e me hospedo em hotéis como o Copacabana Palace. 

Assim, é construindo todo um universo que viajo em uma nave quântica, domo leões de asas e chego ao fim do mundo, o infinito.  

Certa vez, perguntaram-me: Por que escreves?

– Para ofertar rosas para a madrugada. Para viver – respondi. – Pois só com as palavras desnudo a luz e voo até o fim do mundo. Por isso, escrevo granadas intensas como buracos negros e garimpo o verbo como o primeiro beijo. Escrevo porque escrever traz aos meus sentidos cheiro de maresia, Dom Pérignon, safra de 1954, o labirinto do púbis no abismo do acme, mulher nua como rosa vermelha desabrochando.

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