sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Por que mudar a capital do Rio de Janeiro para Brasília? HIENA mostra as duas faces da cidade

Capa de HIENA em edição do Clube de Autores: luz e sombra

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 31 DE JANEIRO DE 2025 – Os Estados Unidos são uma referência para o planeta. A primeira capital americana foi Nova Iorque (1785-1790), já a maior cidade americana, então com 60 mil habitantes. Depois foi Filadélfia (1790-1800), outra importante cidade americana à época, mas, em 1800, a capital foi transferida para Washington, Distrito de Columbia, então com 8.144 habitantes. 

No Brasil, ocorreu algo semelhante. A primeira capital foi Salvador de Todos os Santos (1549-1763). O litoral da Bahia era, à época, a região mais conhecida dos portugueses no Novo Mundo. Em 1763, o ouro de Minas Gerais enviado para Portugal pelo Rio de Janeiro sustentava a coroa portuguesa. Não deu outra, o primeiro ministro do rei Dom José I (1714-1777), Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, transferiu a capital do Brasil-Colônia para o Rio de Janeiro, que tinha, então, cerca de 60 mil habitantes. 

Entre 1815 e 1822, o Rio se tornou capital do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e, em 1822, capital do Império do Brasil, e continuou capital da República, em 1889, até 1960, quando a capital foi transferida para Brasília. O Rio já era, então, a segunda maior cidade do país, superada apenas por São Paulo, e epicentro da vida cultural brasileira e principal palco da identidade nacional, tema do meu romance histórico A IDENTIDADE CARIOCA. 

Mas por que transferir a capital do país de uma das cidades mais cosmopolitas do mundo para o sertão? Talvez por razões semelhantes às que levaram os americanos a trocarem Nova Yorque por Washington. Senão vejamos. 

Em 31 de janeiro de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek toma posse. Vendo que não conseguiria chegar ao fim do seu mandato, em 31 de janeiro de 1961, se a capital continuasse no Rio de Janeiro, aproveitou uma ideia que começou no Brasil-Colônia, no século XVIII, de transferir a capital do Brasil para o interior do país. 

Um dos primeiros a pensar nisso foi Marquês de Pombal, entre 1750 e 1777, um dos mais destacados representantes do despotismo esclarecido, responsável por reformas que catapultaram a economia do reino e das colônias. Em 1761, Pombal sugeriu a transferência da capital do Brasil-Colônia para o interior do país, contratando o cartógrafo italiano Francesco Tosi Colombina para estudar a geografia do Planalto Central. 

Em 1789, ano da Revolução Francesa, Joaquim José da Silva Xavier, mais conhecido como Tiradentes, também pensou em uma nova capital, mas em um país independente. Joaquim José da Silva Xavier nasceu na Fazenda do Pombal, próxima ao arraial de Santa Rita do Rio Abaixo, disputado, à época, pelas vilas de São João del-Rei e São José del-Rei, no hoje município de Ritápolis/MG, foi batizado em 12 de novembro de 1746 e faleceu no Rio de Janeiro, em 21 de abril de 1792. 

Dentista, tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista político, foi um dos líderes da Inconfidência Mineira, conspiração separatista do Brasil-Colônia de Portugal. Tiradentes foi preso, julgado e enforcado publicamente em 21 de abril de 1792, no Rio de Janeiro. Esquartejado, seu corpo foi exposto. Após o golpe da República, em 15 de novembro de 1889, os golpistas, visando criar uma identidade republicana e enterrar o império, tornaram Tiradentes herói nacional, patrono cívico do Brasil e das polícias militares e civis. O 21 de Abril é feriado nacional. Em Minas Gerais, a antiga Vila de São José do Rio das Mortes foi renomeada cidade de Tiradentes em sua homenagem. 

Mitificado, pintam-no à semelhança do Jesus Cristo hollywoodiano. A iconografia tradicional de Tiradentes é de um homem de cabelos e barbas longas, como Jesus Cristo, no cadafalso. Porém, como militar, o máximo que Tiradentes poderia ter no rosto seria um discreto bigode. Na prisão, onde esperou ser executado durante três anos, teve barba e cabelo raspados, para evitar piolho. 

Em 1808, quando Dom João VI, fugindo da invasão de Portugal pelo imperador francês Napoleão Bonaparte, mudou-se com a corte para o Rio de Janeiro, então uma pequena cidade, incompatível para abrigar a corte de Portugal. Também, na época, a localização costeira do Rio de Janeiro deixava a cidade vulnerável a ataques estrangeiros pelo mar. No século XVI, os franceses conquistaram facilmente a Baía de Guanabara e instalaram a França Antártica. No século XVIII, corsários franceses tomaram o Rio e só o libertaram após dois meses, quando receberam um gordo troféu para deixarem a cidade. 

Em 1813, a interiorização da capital ganhou as páginas do influente Correio Braziliense, editado por Hipólito José da Costa, para quem a nova cidade deveria ser construída na capitania de Goiás, no ponto onde nascem “caudalosos rios que se dirigem ao norte, ao sul, ao nordeste e ao sudeste”. Segundo Hipólito, isso permitiria o contato fluvial da capital com todo o território brasileiro. O que não é verdade. 

Em 1823, o ministro e deputado José Bonifácio de Andrada e Silva (SP), conhecido como Patriarca da Independência, propôs à Assembleia Constituinte a transferência da capital para o interior e sugeriu que se chamasse Brasília. Em 1892, o belga Louis Cruls mapeou um território no Planalto Central para a construção da nova capital. 

“Como essa cidade deve ficar equidistante dos limites do Império tanto em latitude como em longitude, vai-se abrir, por meio das estradas que devem sair desse centro como raios para as diversas províncias, uma comunicação e decerto criar comércio interno da maior magnitude. Vai-se chamar para as províncias do sertão o excesso da povoação sem emprego das cidades marítimas e mercantis” – propôs Bonifácio. 

Só que Dom Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte e a transferência da capital foi para a gaveta, tanto que na Constituição imposta pelo imperador, em 1824, não se fala nisso. 

Mas no reinado de Dom Pedro II, a campanha pela nova capital renasceu, encabeçada pelo historiador Francisco Adolfo de Varnhagen. Ele argumentava que a permanência da sede do Império no Rio significava a continuidade do atraso colonial, que a entrada do Brasil na modernidade dependia dessa transferência. 

Inspirado por Varnhagen, o senador (1838-1863/PE) Antônio Francisco de Paula de Holanda Cavalcanti de Albuquerque, Visconde de Albuquerque, apresentou um projeto de lei prevendo uma nova capital. Para ele, o sertão teria boa utilidade se fosse ocupado por plantações de café, então o motor da economia nacional. 

“O Brasil deve, em minha opinião, ser mais uma nação agrícola do que comercial. Ora, o desenvolvimento da agricultura em vasta escala não poderá conseguir-se senão promovendo-se a formação de grandes estabelecimentos no centro do Império. O meio mais óbvio que se antolha para realizá-los é a criação da capital nesse centro” – argumentou. 

Segundo ele, a cidade poderia ficar pronta em dez anos, usando como mão de obra escravos negros, que, aliás, construíram o Brasil debaixo de chicote, até a Lei Áurea, assinada em 13 de maio de 1888, pela Princesa Isabel, quando os negros passaram a outra casta, de escravos para marginais; poderiam ser presos até por olharem nos olhos de uma autoridade, ou policial. A proposta foi para a gaveta e o Cerrado não foi ocupado por cafezais, mas, depois da inauguração de Brasília, em 21 de abril (Tiradentes) de 1960, por extensas plantações de soja. 

Em 1877, Varnhagen partiu para a ação. Embrenhou-se pelos sertões do Planalto Central para identificar o ponto onde seria construída a nova cidade, que se chamaria Imperatória, em homenagem ao imperador Dom Pedro II, e seria construída exatamente entre as lagoas Formosa, Feia e Mestre d’Armas. 

O tema foi desengavetado na Assembleia Constituinte de 1891, após a derrubada da Monarquia. O senador constituinte Virgílio Damásio (BA) apresentou uma proposta denominando a nova capital do Brasil de Cidade Tiradentes e argumentou que o Rio de Janeiro estava inchado, com 400 mil moradores; um barril de pólvora. 

“Nesta cidade populosa, falemos a verdade, encontram-se muitos que vivem entre a ociosidade e manejos ou expedientes poucos confessáveis. Essa grande massa de homens é uma arma, uma alavanca poderosíssima em mãos de agitadores. Uma cidade populosa não convém para capital” – disse. 

O deputado constituinte Thomaz Delfino (DF) concordou com Virgílio Damásio. “Uma capital não se sente muito bem no meio da multidão da vasta cidade, por sua natureza agitada e, de vez em quando, algum tanto revolucionária. É sabido que nos Estados Unidos da América do Norte os diferentes estados têm geralmente pequenas cidades por capitais. A sede do governo do estado de Nova York não é a riquíssima cidade desse nome e sim a insignificante Albany. Quando a capital da União Americana foi fixada em Washington, era esta apenas uma pequena cidade de 70 a 80 mil habitantes” – argumentou. 

Com efeito, a deposição de Dom Pedro II era um nervo exposto. Inclusive, dom Pedro II poderia ter resistido, pois teve todo o apoio necessário para isso, mas parece que ele queria mesmo era se aposentar, e a herdeira do Império, a princesa Isabel, era mais beata do que estadista. Havia a preocupação, por parte dos republicanos, de uma insurreição pela volta do Império. A minoria republicana que deu o golpe contra o Império não contava com respaldo popular; o Rio de Janeiro era monarquista. Durante os governos de Deodoro da Fonseca (1889-1891) e Floriano Peixoto (1891-1894), ambos militares, o Rio foi bombardeado por navios de guerra dos insurgentes da Revolta da Armada. 

Mas como a Constituição de 1891 previa a construção de um novo Distrito Federal no centro do Brasil, os dois primeiros presidentes da República, Deodoro e Floriano, seguiram a lei e criaram uma comissão de técnicos para delimitar, no interior de Goiás, o quadrilátero da futura capital. 

Sucessor de Deodoro e Floriano, e primeiro civil a ocupar a Presidência da República, Prudente de Moraes (1894-1898) engavetou o plano, argumentando que os cofres públicos não tinham dinheiro para a empreitada. Mas o motivo era outro. Quem então mandava no país eram as oligarquias nos estados, porque eram quem sustentavam o Estado. E eles não queriam que a capital saísse do Rio, que fervilhava, inclusive Prudente de Moraes escapou por um triz de ser assassinado a espada, durante a cerimônia de boas-vindas às tropas que haviam massacrado Canudos. No governo de Rodrigues Alves (1902-1906), que sucedeu Campos Salles (1898-1902), o Rio foi depredado pelos cariocas na Revolta da Vacina. 

Em 1905, o senador Nogueira Paranaguá (PI) apresentou projeto de lei dando prazo para a mudança da capital até 1921, cem anos da Independência do Brasil. Paranaguá argumentou que o Rio não espelhava o Brasil: “Esta é uma cidade cosmopolita por excelência. Aqui, há o elemento português, o italiano, o alemão, o espanhol e muitos outros. Os estrangeiros têm força preponderante. Os interesses desta cidade são muitas vezes antagônicos com o interesse nacional. Eu quero uma capital tranquila, verdadeiramente nacional, em que o brasileirismo seja predominante” – disse. 

Além disso, alegava que o clima do Rio não era bom: “Neste momento, estou a sentir um calor senegalesco. Eu estou transpirando, apesar destes ventiladores. Nós vemos que o próprio presidente da República se retira da capital durante alguns meses do ano por não poder ficar neste clima asfixiante”. 

De fato. O Rio, cercado pela Baía de Guanabara, era também rodeado de pântanos, ambiente propício para a disseminação de cólera, peste bubônica e febre amarela. “No Planalto Central teríamos uma capital que reuniria todas as condições de salubridade” – observou Nogueira Paranaguá. Tanto que Rodrigues Alves, o primeiro presidente eleito no século XX, executou uma reforma radical na região portuária do Rio para combater a insalubridade, demolindo cortiços e construindo amplas avenidas, praças e edifícios públicos, uma Paris tropical. Não queria nem ouvir falar em capital no Planalto Central. 

Mas, em 1922, é construído um obelisco na zona rural de Planaltina/DF, a mando do presidente Epitácio Pessoa (1919-1922). Em 1929, o intelectual Theodoro Figueira de Almeida publicou um plano da futura cidade, que teria ruas e praças com nomes que contariam a história do Brasil desde Pedro Álvares Cabral. Ainda em 1922, o tenente-coronel Luiz Mariano de Barros Fournier, professor da Escola Militar, apresentou ao Senado uma parceria público-privada que lhe permitiria liderar a construção da nova capital. O governo só teria que providenciar 67 mil contos de réis e o tenente-coronel entregaria a cidade pronta, em 1931. 

“O proponente permite-se assegurar-lhes que conhece perfeitamente o problema que se propõe resolver, que, educado em severo regime militar, tem inteira noção do que seja responsabilidade e que o exercício de suas funções no magistério militar é uma prova de que se acha em pleno gozo de perfeita razão” – negociou o tenente-coronel. Os senadores agradeceram a proposta e a engavetaram imediatamente. 

Durante os trabalhos da Assembleia Constituinte de 1934, o deputado Nero de Macedo (PSR/GO) lamentou: “As circunstâncias já têm demonstrado a necessidade de uma nova capital. Os governantes, porém, ou por pirronice, ou por inércia, jamais cumpriram o dispositivo constitucional. Nós conhecemos bem os costumes políticos, conhecemos bem o encanto que tem o Rio de Janeiro”. 

A Revolução de 1930 enfraqueceu as oligarquias estaduais e a transferência da capital para o Planalto Central voltou com força à Constituição de 1934. Foi nesse clima que o diretor do Serviço de Informações e Estatísticas do Ministério da Educação, Mário Augusto Teixeira de Freitas, propôs ao governo de Getúlio Vargas a transferência da capital para o interior, aos poucos. 

A cidade visada foi Belo Horizonte, a capital mineira, planejada e fundada em 1897. Ela se tornaria a capital provisória do país, até que as obras da nova capital, Cabrália (em homenagem a Pedro Álvares Cabral, descobridor do Brasil) fosse construída em Goiás. Teixeira de Freitas não conseguiu nada com Getúlio Vargas, mas, em 1938, ajudou a fundar o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que endossou o projeto em duas etapas da nova capital. 

Na Assembleia Constituinte de 1946, convocada após a queda da ditadura do Estado Novo, os parlamentares acharam que em vez de Belo Horizonte a capital seria Goiânia, inaugurada em 1942. 

“Não vemos como se possa realizar, nos próximos decênios, a obra ciclópica da nova capital do Brasil, que deve ser projetada com a maior perfeição e caprichosamente executada, para não prejudicar o futuro do país. Planificada e construída em moldes moderníssimos, é Goiânia a cidade ideal, entre todas as suas irmãs, para sede provisória do governo da República. Ela já está ali à nossa vista, ao nosso alcance” – propôs o deputado constituinte Diógenes Magalhães (PSD/GO). 

Os constituintes da bancada de Minas Gerais reagiram a Diógenes Magalhães e ofereceram o Triângulo Mineiro para o novo Distrito Federal, inclusive o deputado Juscelino Kubitschek (PSD/MG): “Trago ao conhecimento dos senhores representantes um magnífico trabalho de autoria do secretário de Viação do estado de Minas Gerais. Nele, além de sugerir a mudança da capital para o pontal do Triângulo Mineiro, são estudados os variados aspectos do problema e apontada uma solução que satisfaz os partidários da ideia da mudança da capital” – discursou Juscelino, em 1946. 

Durante o governo Nereu Ramos (1955-1956), em 1955, foi enviada nova missão ao Planalto Central, a qual recomendou que o Distrito Federal fosse criado no mesmo local, em Goiás, já delimitado na época de Floriano Peixoto, e que a futura cidade fosse chamada de Vera Cruz, um dos nomes dados ao Brasil logo depois do Descobrimento. 

Em 1955, Juscelino Kubitschek (1956-1961) disputou a Presidência da República e prometeu, na campanha, construir Brasília. Empossado em 1956, dedicou seu governo à sua promessa. Abriu um concurso para o Plano Piloto da nova cidade, vencido pelo arquiteto e urbanista Lucio Costa. 

O fato é que Juscelino Kubitschek viu que se fosse eleito não chegaria ao fim do seu mandato se a capital continuasse no Rio, de modo que a construção de Brasília faria com que ele se ausentasse amiúde daquele barril de pólvora e mantivesse seu nome aceso em nível nacional. 

“Juscelino poderia ter descumprido a promessa. Nada o obrigava a cumpri-la. Ele não seria o primeiro político a não cumprir a totalidade do seu programa eleitoral. O que ocorreu foi que Juscelino, um herdeiro do getulismo, se elegeu com apenas 35% dos votos, e setores conservadores da política e das Forças Armadas, os mesmos que haviam levado Getúlio ao suicídio, questionaram essa vitória. No fim de 1955, houve duas tentativas de golpe de Estado para impedir a posse de Juscelino. No início de 1956, uma revolta militar tentou derrubá-lo. Nesse ambiente hostil, Juscelino percebeu que a transferência da capital tinha a capacidade de mobilizar o imaginário da nação e colocá-la ao seu lado. Foi por isso que levou a ideia adiante” – analisa o historiador francês Laurent Vidal, autor do livro De Nova Lisboa a Brasília (Editora UnB). 

Para Vidal, os brasileiros desconhecem a história que antecede Brasília, a partir da vinda da corte de dom João VI para o Brasil, com todas as Brasílias imaginadas. JK conseguiu criar para si a imagem do mito que fez tudo sozinho: “É importante que os brasileiros conheçam a história completa de Brasília para que, assim, conheçam a si próprios. A ideia de uma nova capital no Planalto Central apareceu de tempos em tempos, sempre em momentos de crise e ruptura, como forma de reaglutinar o país dividido. Foi assim após a Independência, após a Proclamação da República, após a Revolução de 1930, após a ditadura do Estado Novo. A nova capital sempre trouxe essa ideia de progresso, de modernidade, o que mexe forte com o imaginário das pessoas. Mas, na avaliação dos governantes, bastava formular o projeto. Não era preciso ir até o fim. Por 150 anos, o importante foi apenas superar as crises”. 

Brasília foi inaugurada em 21 de abril de 1960. Os militares adoraram. Em 1964, deram um golpe. Em Brasília, naquela época, não existia a possibilidade de protesto popular. Nem povo Brasília tinha, ainda. A Ditadura dos Generais durou até 1985. 

Há o mito de que São João Bosco, italiano, fundador da Congregação dos Salesianos, teria sonhado com Brasília, em 1883, e profetizado a construção da cidade, segundo o livro Memórias Biográficas de São João Bosco, de seu assistente, padre Lemoyne. Em agosto de 1883, Dom Bosco sonhou que fazia uma viagem à América do Sul, onde jamais esteve. No sonho, visitou um território que ia da Colômbia ao sul da Argentina. Segundo ele: “Entre os graus 15 e 20 havia uma enseada bastante longa e bastante larga, que partia de um ponto onde se formava um lago. Disse então uma voz repetidamente: – Quando se vierem a escavar as minas escondidas no meio destes montes aparecerá aqui a terra prometida, de onde jorrará leite e mel. Será uma riqueza inconcebível”. 

Diz-se que o lago mencionado por Dom Bosco é o Paranoá. A primeira obra de alvenaria erguida na nova capital foi a Ermida Dom Bosco, uma pequena capela piramidal projetada por Oscar Niemeyer, às margens do Lago Paranoá, construída em 1957, em homenagem ao santo, que se tornou padroeiro de Brasília, juntamente com Nossa Senhora Aparecida, e os Salesianos foi a primeira ordem religiosa a chegar a Brasília, em 1956, atuando nos acampamentos dos candangos. 

Juscelino Kubitschek construiu Brasília, mas, a partir de 1988, o goiano Joaquim Domingos Roriz terminou de construí-la. Roriz foi governador do Distrito Federal quatro vezes, durante 13 anos, de outubro de 1988 a março de 1990; de março de 1991 a janeiro de 1995; e de janeiro de 1999 a março de 2006. Construiu nove cidades dentro do quadrilátero do Distrito Federal e ampliou o sistema viário. 

Hoje, Brasília é a terceira maior cidade do país, com 2.982.818 habitantes. Epicentro, liga por rodovias todo o território nacional. Ficou famosa no mundo inteiro pela prancheta do urbanista Lúcio Costa e do arquiteto Oscar Niemeyer, ambos cariocas. Foi no Rio de Janeiro que a dupla começou a pensar Brasília, principalmente na Esplanada do Castelo e na Barra da Tijuca. Assim, Brasília é continuação da identidade carioca. 

Os brasilienses ficam possessos quando viajam pelo Brasil e lhes perguntam se estão roubando muito em Brasília. Costumam responder: – Sim, os ladrões que vocês enviaram para lá. – É que o Distrito Federal abriga a cúpula dos três poderes, e o Congresso Nacional recebe representantes de todos os Estados e de todos os segmentos da sociedade, inclusive das fações criminosas. 

Publiquei um thriller policial, HIENA, que mostra a Brasília de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer e a Brasília subterrânea, especialmente a da Praça dos Três Poderes e da Esplanada dos Ministérios. Nessa ambientação, circulam personagens de ficção e reais, vivos ou mortos, honestos ou corruptos. Mas há também uma Brasília que unifica o país, ao reunir todas as culturas brasileiras e legar isso às novas gerações.

Capa de A IDENTIDADE CARIOCA na edição do Clube de Autores

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